29 de novembro de 2012

LAURO BACCA


"As cinco bocas da vaca

Monges beneditinos no Paraná, para poderem se manter, entre outras atividades, criam gado numa fazenda ou sítio em Borda do Campo, próximo a Curitiba. Adotam técnicas modernas de manejo de pastagem, como o método Voisin, que inclui como princípio jamais deixar o gado pastando muito tempo num só lugar. Para isso, o pasto é dividido em parcelas. André Voisin, autor do método que leva seu nome, explica que o rendimento do pasto será máximo se as vacas pastarem apenas um dia em cada parcela.

Formado em Agronomia e responsável pela criação de gado de seu mosteiro, o monge beneditino Pierre Recroise, também artista entalhador de madeira, costumava explicar o método Voisin aos visitantes com o curioso comentário de que “a vaca tem cinco bocas, uma que come, e as outras são suas quatro patas”. A boca que come, se permanecer muito tempo no local, vai voltar ao mesmo capim e cortá-lo mais vezes, enfraquecendo-o e impedindo o acúmulo de reservas em suas raízes, necessárias para um início de rebrote vigoroso. As outras quatro “bocas” fazem o resto, através do pisoteio de centenas de quilos em cada passada.

O que as cinco bocas da vaca têm a ver com ecologia e meio ambiente? Os primeiros resultados do Inventário Florístico Florestal do Estado nos dão a resposta, principalmente na região do Planalto, onde ainda é forte a antiga tradição da invernada, em que o gado é liberado para circular nas matas livremente nos meses do inverno. O estrago é imenso, mas só percebido por agricultores bons observadores ou por quem entende do assunto, como o doutor Alexander Vibrans, da Furb. A boca que come, corta e danifica inúmeras mudas das futuras árvores daquela floresta e as outras quatro “bocas” pisoteiam, quebram e compactam o solo do local. O resultado são as “florestas ocas”, no dizer da botânica Lúcia Sevegnani, também da Furb – florestas sem mudas de árvores, com um grande vazio de regeneração em seu interior.

Quem não entende do assunto, olha do avião e afirma que ainda temos muita área preservada. Não sabe que aquilo que vê de longe mal chega a ser um espectro da floresta que foi no passado. No pouco que restou, caçadores continuam matando impunemente os poucos exemplares sobreviventes de uma fauna que outrora foi exuberante. Leis ambientais feitas para proteger não são cumpridas e agora também são contestadas. O golpe de misericórdia que poderá acabar de vez com essas outrora exuberantes florestas, quem diria, está sendo aplicado por ninguém menos que nossas inocentes e simpáticas vaquinhas. Coitadas. Como nós, humanos, também elas não sabem o que fazem."
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