11 de fevereiro de 2013

CEZAR ZILLIG




Eu também não


Pelas mesmas razões do Maicon, também não pretendo tratar da tragédia de Santa Maria. Repisar aquela dor. O país está nauseado de tanto ouvir e ver este assunto. Mas há desdobramentos tão burlescos que, estes sim, requerem comentários. O Maicon ressaltou o oportunismo da mídia. Ressalto o ingênuo oportunismo das “autoridades”, demonstrando como trabalham sem métodos, planos, programas, constância. Não agem, apenas reagem, impulsivamente.

Agora, “autoridades” do país todo querem mostrar serviço. “Forças-tarefas” (argh!) vasculham escurinhos de boates em busca de negligências dos proprietários. Só dos proprietários. Ah, como são negligentes estes empresários da noite: ou faltam portas ou são estreitas. Extintores estão com prazos de validade vencidos (extintores têm prazos de validade absurdamente curtos). Revestimentos acústicos combustíveis que queimam rápido e liberam fumaça mortífera etc. e tal. Quanto mais defeitos procuram demonstrar, mais patente fica a falha da fiscalização, mais evidenciam a incúria. Em São Paulo, se descobriu que a maioria das casas noturnas funciona sem alvará. Lá é uma dificuldade obter-se um alvará, mas... há jeitinhos à venda.

Em Santa Maria montarão agora o circo da “reconstituição”. Precisa?

O detalhe triste, indecente e cruel a destacar é a necessidade de uma montanha de cadáveres reunidos no mesmo local e fulminados na mesma ocasião para só então as “autoridades competentes” demonstrarem preocupação e ação.

As autoridades (e o povo, vá lá!) só se comovem assim. Desde a tragédia de Santa Maria, transcorreram 16 dias e neste período devem ter morrido no trânsito cerca de 1.840 pessoas. Por terem morrido solitárias, à prestação e dispersas país afora, por não formarem uma montanha de corpos visíveis, palpáveis, só comovem seus familiares; a sociedade e respectivas autoridades permanecem indiferentes. Estas mortes no trânsito são “normais”. Só aparecem nas estatísticas. Estatísticas são números, são gráficos numa folha limpa de papel, sem sangue, sem lágrimas.

Nenhuma “força-tarefa” é convocada, nenhum caso é “reconstituído”. Não há “assistência psicológica”. As mazelas das estradas, seus defeitos, seus monstruosos e diários congestionamentos, sinalização equivocada, o uso da motocicleta etc., não são revistos, examinados, nada.

No Brasil, hoje, as mortes nas estradas não são prioridade; prioridade absoluta é a Copa do Mundo!

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Também publicado em: www.santa.com.br

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