9 de abril de 2012
TOQUE DE RECOLHER/ACOLHER
OPINIÃO DE UM PROMOTOR:
"estou um pouco sem tempo, mas oportunamente lhe encaminharei um texto
sobre o assunto que certamente repudia essa restrição de direitos.
Apenas será possível regulamentação da matéria através de Portaria da
Autoridade Judiciária, caso a caso, pois, do contrário, é a volta da
"ditadura", agora, "moral".
A Lei Municipal não pode alterar texto legislativo federal (Estatuto
da Criança e do Adolescente) e muito menos contrapor-se ao direito de
liberdade assegurado pela Constituição da República de 1988.
Ademais, observe que qualquer cidadão poderá ocupar a tribuna e pautar
assuntos e temáticas na Câmara Municipal, e, isto se encontra no
regulamento da casa legislativa."
enviado por e-mail.
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38 comentários:
No meu entender, após a audiencia pública do dia 25, esse projeto perderá seu objeto.
Porém, precisamos ficar alerta e fazer com que o poder legislativo e executivo, cumpram a carta magna, com apoio do judiciário.
Nada mais do quê muitos já comentaram aqui!!
Sendo que se a lei for aprovada, o próprio MP deverá abrir processo, para derrubar a inconstitucionalidade.
Mas fazer o quê se os ignorantes do legislativo e os do povo não querem entender!
Ou melhor, os vereadores que fazer teatro eleitoreiro, querem dizer que eles queriam>
E os trouxas ignorantes entram na conversa.
Basta cumprir o ECA, e dar mais poder ao conselho tutelar.
É fácil torna os adolescentes de 16 anos maiores de idade recolhe e deixa preso (redução da idade Penal). A Hermann Weege é uma baderna qdo tem eventos no Momma, bando de adolescentes bêbados quebrando tudo, abrindo as torneiras, urinando na rua etc. Poe estes baderneiros na cadeia e faz os pais assumirem a função de pais.
deixa os adolescentes fazerem o que querem, libera geral,
desisto...
CENTRO DE APOIO OPERACIONAL DAS PROMOTORIAS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
Posição oficial:
Toque de recolher para crianças e adolescentes
CONSIDERANDO as notícias veiculadas recentemente na mídia nacional, dando conta da expedição, em diversos municípios, de leis municipais e portarias judiciais estabelecendo "toques de recolher" para crianças e adolescentes;
CONSIDERANDO que o direito à liberdade de locomoção, além de se constituir num direito fundamental e natural, se constitui numa garantia individual contra o arbítrio estatal a todos assegurada de maneira expressa pelo art. 5º, caput e inciso XV, da Constituição Federal;
CONSIDERANDO que os direitos e garantias individuais, por força do disposto no art. 60, §4º, da Constituição Federal, não são passíveis de supressão sequer por emenda constitucional, muito menos por normas infraconstitucionais de qualquer espécie;
CONSIDERANDO que, por serem titulares de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana (cf. art. 3º, da Lei nº 8.069/90), crianças e adolescentes também têm direito à liberdade, que lhes é expressamente assegurado pelos arts. 4º, caput, 15 e 16, da Lei nº 8.069/90, incumbindo a todos respeitar e fazer respeitar com a mais absoluta prioridade;
CONTINUAÇÃO
CONSIDERANDO que, como reflexo do disposto no art. 5º, inciso LXI, da Constituição Federal, crianças e adolescentes somente podem ser privados de liberdade quando em flagrante de ato infracional ou mediante ordem escrita, fundamentada, individualizada e legal de autoridade judiciária competente (cf. art. 106, da Lei nº 8.069/90), sendo considerado crime sua privação de liberdade fora das hipóteses legais (cf. art. 130, da Lei nº 8.069/90);
CONSIDERANDO que o cerceamento indiscriminado à liberdade de crianças e adolescentes, fora das hipóteses permitidas pelo art. 106, da Lei nº 8.069/90, além de atentatório aos dispositivos constitucionais já citados, fere o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana e o disposto nos arts. 2º, nº 2; 15; 16 e 37, letra "b", da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, de 1989, sendo absolutamente incompatível com o Estado Democrático de Direito no qual vivemos;
CONSIDERANDO que compete acima de tudo aos pais ou responsável, e não à autoridade judiciária, educar e estabelecer limites às crianças e adolescentes, o que compreende o controle do horário de permanência fora de casa, bem como o controle sobre as companhias e locais que aqueles freqüentam;
CONSIDERANDO que o combate à violência envolvendo crianças e adolescentes, seja na condição de autores ou vítimas, pressupõe a tomada de medidas muito mais abrangentes e eficazes que a singela e pífia decretação de "toques de recolher", compreendendo desde a orientação dos pais e responsáveis, no sentido do exercício efetivo e comedido de sua autoridade em relação a seus filhos e pupilos, até a rigorosa fiscalização dos locais onde são comercializadas bebidas alcoólicas;
CONSIDERANDO que o combate à violência demanda, acima de tudo, o enfrentamento de suas causas, cabendo ao Poder Público elaborar e implementar políticas públicas destinadas à prevenção e tratamento especializado para usuários de substâncias entorpecentes (cf. art. 227, §3º, inciso VII, da Constituição Federal), combate à evasão escolar e inserção/reinserção de crianças e adolescentes no Sistema de Ensino (cf. art. 206, inciso I e 208, da Constituição Federal), orientação, apoio e promoção social das famílias (cf. art. 226, caput e §8º, da Constituição Federal), que por sua vez demanda o aporte de recursos orçamentários dos mais diversos setores da administração, com a prioridade absoluta preconizada pelo art. 227, caput, da Constituição Federal e art. 4º, caput e parágrafo único, da Lei nº 8.069/90;
CONSIDERANDO, enfim, que cabe ao Ministério Público a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, como é o caso do direito à liberdade de crianças e adolescentes,
CONTINUAÇÃO
O Centro de Apoio Operacional das Promotorias da Criança e do Adolescente do Estado do Paraná vem externar sua posição em relação aos mencionados "Toques de Recolher" nos seguintes termos:
I - O direito à liberdade de locomoção, assegurado a todas as crianças e adolescentes, assim como a todos os demais cidadãos, pelo art. 5º, inciso XV, da Constituição Federal, se constitui num direito natural que não admite cerceamento por qualquer norma infraconstitucional, o que compreende desde as leis federais, estaduais e municipais até uma singela portaria judicial;
II - Eventual tentativa de supressão ao direito à liberdade de crianças e adolescentes importa também em frontal violação às disposições contidas nos arts. 3º, 4º, caput, 5º, 15, 16, inciso I e 18, da Lei nº 8.069/90;
III - A competência normativa da Justiça da Infância e da Juventude está restrita às hipóteses taxativamente relacionadas no art. 149, da Lei nº 8.069/90, que de maneira expressa veda determinações de caráter geral (cf. parágrafo segundo do citado dispositivo), posto que não cabe à autoridade judiciária "legislar" e, muito menos, decidir de forma contrária à lei e à Constituição Federal;
IV - Qualquer portaria ou mesmo lei, seja de nível Federal, Estadual ou Municipal, que tenha a pretensão de suprimir o direito de ir e vir de crianças e adolescentes padece de inconstitucionalidade manifesta, devendo ser considerada ato normativo inexistente, posto que contrário a uma garantia constitucional instituída a todos pela Lei Maior que não pode ser suprimida sequer por meio de emenda constitucional;
V - Eventual apreensão de crianças e adolescentes decorrentes dos referidos "toques de recolher" importa, em tese, na prática do crime tipificado no art. 230, da Lei nº 8.069/90, posto que a privação de liberdade de criança ou adolescente somente será legal quando configurado flagrante de ato infracional ou quando da existência de ordem legal, expressa, fundamentada e individualizada de autoridade judiciária competente (o que não é o caso, logicamente, de uma portaria genérica e ilegal, expedida fora do âmbito da competência normativa da Justiça da Infância e da Juventude ou de uma lei manifestamente inconstitucional);
VI - São os pais ou o responsável legal (e não o Juiz), que usando de sua autoridade, devem estabelecer, através do diálogo, os limites para permanência de seus filhos e pupilos nas ruas, podendo para tanto receber a orientação e, se necessário, o apoio estatal, nos moldes do previsto no art. 129, inciso IV, da Lei nº 8.069/90, o que por sinal faz parte do dever elementar de educação, inerente ao poder familiar, tutela ou guarda;
CONTINUAÇÃO
V - Eventual apreensão de crianças e adolescentes decorrentes dos referidos "toques de recolher" importa, em tese, na prática do crime tipificado no art. 230, da Lei nº 8.069/90, posto que a privação de liberdade de criança ou adolescente somente será legal quando configurado flagrante de ato infracional ou quando da existência de ordem legal, expressa, fundamentada e individualizada de autoridade judiciária competente (o que não é o caso, logicamente, de uma portaria genérica e ilegal, expedida fora do âmbito da competência normativa da Justiça da Infância e da Juventude ou de uma lei manifestamente inconstitucional);
VI - São os pais ou o responsável legal (e não o Juiz), que usando de sua autoridade, devem estabelecer, através do diálogo, os limites para permanência de seus filhos e pupilos nas ruas, podendo para tanto receber a orientação e, se necessário, o apoio estatal, nos moldes do previsto no art. 129, inciso IV, da Lei nº 8.069/90, o que por sinal faz parte do dever elementar de educação, inerente ao poder familiar, tutela ou guarda;
V - A instituição de "toques de recolher" para crianças e adolescentes, além de se tratar de uma prática ilegal e inconstitucional, não garante maior harmonia na família, não se mostra uma medida eficaz para coibir o consumo de álcool e outras substâncias entorpecentes e, muito menos, contribuem para diminuição da violência entre jovens, apenas fazendo com que tais práticas se transfiram de horário e local, sem qualquer resultado prático;
VI - Cabe ao Poder Público elaborar e implementar políticas públicas sérias e consistentes destinadas à prevenção e ao combate à violência em todas as faixas etárias, não sendo admissível qualquer prática discriminatória em relação a crianças e adolescentes, sob pena de afronta ao disposto no art. 5º, da Lei nº 8.069/90 e art. 227, caput, da Constituição Federal;
VII - Crianças e adolescentes que perambulam pelas ruas durante a noite, consumindo bebidas alcoólicas e drogas, na sua grande maioria estão fora do sistema de ensino, devem ser consideradas vítimas da omissão da família, da sociedade e do Poder Público, que na forma da lei e da Constituição Federal deveriam se unir na descoberta de soluções concretas e efetivas para o problema, tendo como preocupação a promoção e defesa de seus direitos, e não na busca de alternativas para sua pura e simples repressão, como é o caso da instituição dos referidos "toques de recolher", cujo efeito é meramente "pirotécnico", posto que não enfrentam as verdadeiras causas da violência;
VIII - A supressão de direitos individuais, a pretexto da proteção infanto-juvenil, se constitui num retrocesso à sistemática vigente sob a égide do revogado "Código de Menores", que tratava crianças e adolescentes como meros "objetos" de intervenção estatal e não como sujeitos de direitos, tal qual são hoje considerados pela Lei nº 8.069/90 e pela Constituição Federal;
CONTINUAÇÃO
IX - Cabe às autoridades públicas, assim como à família e à sociedade, através do diálogo, da ação em regime de colaboração e do investimento em políticas públicas, buscar formas mais adequadas e eficientes para proteção integral de todos os direitos infanto-juvenis, tal qual preconizado pela Lei nº 8.069/90 e pelo art.227, da Constituição Federal, voltando a repressão estatal contra aqueles que, por ação ou omissão, violam tais direitos, respeitando as normas e princípios, inclusive de Direito Internacional, aplicáveis em matéria de defesa e promoção dos direitos de crianças e adolescentes, com ênfase para a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, de 1989.
Este Centro de Apoio destaca, por fim, que possui em sua página da internet farto material destinado a fazer com que família, sociedade e Estado (lato sensu) cumpram de maneira efetiva o papel que lhes é reservado no sentido da mencionada proteção integral de crianças e adolescentes, sem que para tanto tenham de usar de expedientes ilegais, inconstitucionais e ineficazes, como os "toques de recolher", que há muito já deveriam ter sido relegados a um passado de arbítrio e opressão que não mais é compatível com o Estado Democrático de Direito em que vivemos.
Curitiba/PR, junho de 2009.
MÁRCIO TEIXEIRA DOS SANTOS
Promotor de Justiça
MURILLO JOSÉ DIGIÁCOMO
Promotor de Justiça
Ministério Público anuncia ajuizamento de ação de inconstitucionalidade contra lei prevendo toque de recolher para crianças e adolescentes
Segunda-Feira, 15 de Agosto de
2011 as 19:10
A coordenação do Centro de Apoio Operacional de Defesa da Infância e da Juventude da Procuradoria Geral de Justiça divulgou ontem nota contra o "toque de recolher", que impede a permanência de crianças e adolescentes nas ruas após as 23h.
O Ministério Público posiciona-se contra a medida, que pode submetê-los a situações constrangedoras.
“O toque de recolher banaliza as maiores conquistas políticas e sociais referentes aos direitos humanos obtidas pelos
movimentos sociais no mundo inteiro, elegendo as crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade como o inimigo interno, verdadeiro “perigo” contra os quais a comunidade deve lutar, verdadeira “faxina social” que retira forçosamente os
mendigos, meninos e meninas de rua e desempregados dos logradouros públicos, para erradicar a temível violência urbana que infesta os bairros e vilas, corroídos pelo desemprego em massa e pela ausência ou precariedade do trabalho para os pais de famílias”, diz a nota da promotora de Justiça Leida Diniz.
Leida Diniz fala, em sua nota, que o Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da
Criança e do Adolescente, em sua 175ª Assembleia Ordinária, adotou parecer
contrário ao “toque de recolher”.
“Considerando a necessidade de extirpar o caráter midiático do espetáculo moral direcionado contra crianças e adolescentes e por considerá-los sujeitos de direitos, em condição peculiar de desenvolvimento, o Ministério Público
do Estado do Piauí repudia o tratamento de choque apregoado pelo “toque de
recolher”, alertando que devem ser extintas todas as práticas e procedimentos
segregacionistas, que imprimem o pânico e terror sobre crianças e adolescentes”, continua a nota de Leida Diniz.
Leida Diniz defende a garantias a todos/o acesso a programas de ampliação de tempo escolar, contraturnos,
programas esportivos e de lazer, alimentação e nutrição adequadas, de
expressão cultural, de convivência comunitária, centros e praças da juventude.
Leida Diniz anunciou o ajuizamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade contra Leis Municipais que disciplinem o toque de recolher para crianças e adolescentes.
“Será feito o ajuizamento de medidas judiciais e extrajudiciais, para o fim de
obstar a prática de ameaças e violações aos direitos de crianças e
adolescentes, no seu direito de ir , vir e permanecer”, acrescentou Leida Diniz.
SANTA CATARINA
TOQUE DE RECOLHER: DO CLAMOR DA
SOCIEDADE à AFRONTA à LEGISLAçãO
BRASILEIRA
Priscilla Linhares Albino
Promotora de Justiça do Ministério Público de Santa Catarina
Coordenadora-Geral do Centro de Apoio Operacional da Infância e Juventude
Ricardo Paladino
Promotor de Justiça do Ministério Público de Santa Catarina
Coordenador-Geral do Centro de Apoio Operacional da Moralidade Administrativa
SUMÁRIO
Introdução –
1. Breves considerações sobre o histórico do “toque
de recolher” e a situação da infância e adolescência no Brasil nos dias
atuais –
2. A contrariedade da medida restritiva à Constituição Federal
de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente – Conclusão -
Referências bibliográficas
RESUMO
A mídia tem noticiado, amplamente, nos últimos tempos, a implantação em alguns municípios brasileiros do “toque de recolher” para
crianças e adolescentes, medida que, conforme se denota de sua própria
nomenclatura, veda a circulação do público infantoadolescente depois
de determinado horário.
Atendendo ao clamor popular, referentes medidas vêm sendo
instituídas por meio de Portaria do Poder Judiciário ou através de Lei
Atuação Florianópolis V. 7 n. 16 p. 9 - 24 jan./jun. 201010
Municipal, pelas quais fica determinado que as polícias Civil e Militar
abordem os menores de 18 anos, desacompanhados de responsáveis,
que sejam encontrados nas ruas após o horário noturno estipulado e os
encaminhe para o Conselho Tutelar ou para suas residências.
Esquece-se, porém, que a Constituição da República Federativa
do Brasil de 1988, corroborada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, reconheceu a criança e o adolescente como sujeitos de direitos,
garantindo-lhes todos os direitos fundamentais, entre eles, o direito de
ir, vir e permanecer; e que nenhuma Portaria, ainda que expedida pelo
Poder Judiciário, ou Lei Municipal, editada pelos Municípios, tem o
condão de suspender ou contrariar dispositivo constitucional ou legal.
PALAVRAS-CHAVE: Direito à liberdade. Toque de recolher.
Portaria. Lei Municipal.
CONTINUAÇÃO
INTRODUÇÃO
A restrição às garantias de liberdade no Brasil não é fato novo.
Cuida-se de tolhimento já conhecido pela população brasileira que,
nos “Anos de Chumbo”, testemunhou a ditadura militar, época em
que foram utilizadas medidas coercitivas e restritivas de liberdade ao
argumento de proteção da sociedade.
Invocando a memória ditatorial e em um flagrante retrocesso às
conquistas de nosso país na área do Direito da Criança e do Adolescente,
traz-se, para o ordenamento atual, medida restritiva de liberdade denominada “toque de recolher”, em total afronta ao disposto no art. 227 da
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/1988).
Ocorre que, se tal restrição estivesse ocorrendo sob a égide do
Código de Menores de 1979, revogado pelo art. 267 da Lei n. 8.069/1990,
por certo não resultaria em estranheza. Diz-se isso em razão de, àquela
época, estar cunhada a Doutrina da Situação Irregular, a qual não reconhecia a criança e o adolescente como sujeitos de direitos elementares à
pessoa humana, mas, sim, como mero objeto de intervenção do Estado.
Entretanto, não se pode olvidar que, com o advento não só dos
direitos fundamentais previstos na CRFB/1988, mas também do precei-11
tuado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, em seu art. 3º,
a criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem
prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei,
assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios,
todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes
facultar o desenvolvimento físico, mental, moral,
espiritual e social, em condições de liberdade e de
dignidade.
Não fosse isso, tem-se, ainda, a Convenção sobre os Direitos da
Criança, que é tratado internacional, da qual o Brasil é signatário, que
dispõe, em seu art. 16, que
1. Nenhuma criança ou adolescente será objeto de
interferências arbitrárias ou ilegais em sua vida
particular, sua família, seu domicílio, ou sua correspondência, nem de atentados ilegais a sua honra e a
sua reputação. 2. A criança tem o direito à proteção
da lei contra essas interferências ou atentados.
CONTINUAÇÃO
Vê-se, dessa forma, que as portarias judiciais que implementam o
“toque de recolher” são práticas arbitrárias, que caminham em direção
oposta à traçada pela Lei n. 8.069/1990. Contrariam, dessa forma, o rol
taxativo, e não meramente exemplificativo, previsto no art. 149, incs. I
e II, do ECA, donde se infere que a competência para a expedição de
Portarias e Alvarás em nada se confunde com competência legislativa,
de modo que a faculdade do magistrado para disciplinar e autorizar
as situações previstas nas alíneas dos incisos I e II, do referido artigo,
restringe-se à aplicação das normas estatutárias à situação em concreto.
Leis municipais, da mesma forma, não podem estabelecer a
referida medida. E isso porque são materialmente inconstitucionais,
porquanto a restrição imposta pela legislação colide frontalmente com
o art. 5º, inc. II, da CRFB/88, que prevê que “ninguém será obrigado a
fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei” e, ainda,
com o inciso XV, donde se infere a garantia à liberdade de locomoção do
cidadão. Decorre, assim, da conjunção dos incisos supramencionados,
que nenhuma lei ordinária, sob eiva de inconstitucionalidade, poderá
restringir o direito de locomoção das pessoas, exceto naqueles casos já
ditados pela Carta Constitucional. 12
Nessa senda, entende-se que portarias judiciais genéricas e,
mais ainda, leis municipais que versem sobre o “toque de recolher”,
estabelecendo restrições ao direito de ir, vir e permanecer do público
infantojuvenil, assim como seu recolhimento ou encaminhamento de
forma indevida, irregular ou ilegal, tratam-se de medidas atentatórias
aos preceitos constitucionais e legais acima apontados, mormente porque são discriminatórias e desrespeitam o direito à liberdade, ferindo
os princípios da dignidade, do respeito e do desenvolvimento da pessoa
humana, uma vez que coloca sob suspeita, de maneira generalizada,
todas as crianças e os adolescentes.
CONTINUAÇÃO
Há que ser lembrado, a todo tempo, que no Estado Democrático
de Direito a liberdade é direito fundamental extensível a todos, de modo
que ninguém pode ser considerado culpado por ato infracional que não
cometeu, por ser diferente dos demais ou, ainda, simplesmente, por ser
menor de dezoito anos.
1. BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O HISTÓRICO DO
“TOQUE DE RECOLHER” E A SITUAÇÃO DA INFÂNCIA E DA
ADOLESCÊNCIA NO BRASIL NOS DIAS ATUAIS
Ao longo da história percebe-se que a atuação de todos aqueles
envolvidos na implementação do “toque de recolher” foi caracterizada
pelo teor de limpeza social, perseguição e criminalização de seres humanos, sob o manto de suposta proteção.
Referida medida é típica dos Estados autoritários, marcados pela
intolerância, pela discriminação e pela separação dos diferentes do
convívio social, sendo, portanto, incompatível com o espírito do Estado
Democrático de Direito.
Como medida típica de regimes ditatoriais, em que a liberdade das
pessoas é suplantada em prol do rigoroso controle estatal, o “toque de
recolher” não se coaduna com a Carta Constitucional vigente no Brasil,
intitulada de Constituição Cidadã.
Entre 1964 e 1985, período de ditadura militar conhecido como
“Os Anos de Chumbo”, o Brasil, sob os mesmos pretextos de conferir
segurança à população e coibir atos de desordem, experimentou os efei-13
tos de “toques de recolher”, que limitavam horários e locais para a livre
circulação das pessoas. Se há quem defenda que, nesse período, houve
sensível diminuição nos índices de criminalidade, esquecendo-se que
os crimes mais graves passaram a ser praticados pelo próprio Estado,
nítido é que a população nunca foi alvo de tanta opressão, sendo certo
que tal medida não deixou saudades.
CONTINUAÇÃO
à época, vigorava no país o primeiro Código de Menores (conhecido como Mello Matos), sendo um outro, em moldes semelhantes,
editado pela ditadura militar em 1979. Nesses tempos, os doutrinadores
do Direito do Menor, segundo Sêda (2009), diziam que estavam abolidos os princípios gerais de Direito para os menores. Com fulcro nesta
argumentação, e no art. 8º da referida legislação, podiam os juízes, “ao
seu prudente arbítrio” determinar medidas que entendessem as mais
adequadas e “se demonstrassem necessárias à assistência, proteção e
vigilância ao menor”.
Contudo, com a evolução do Direito da Criança e do Adolescente
e com o advento da Lei n. 8.069/1990, tida como uma das legislações
mais avançadas nessa área em todo o mundo, há que se fazer uma reavaliação do proceder dos atores do Sistema de Garantia de Direitos que
continuam agindo sob a sombra do menorismo.
E, nesse caso, a referência se aplica a juízes que, em pleno Século
XXI, continuam expedindo portarias para regulamentar, de forma gené-
rica, o direito de ir, vir e permanecer de meninos e meninas brasileiros.
Há que ser salientado, contudo, que não se está defendendo, aqui,
o posicionamento de que a criança e o adolescente poderão permanecer
em situação de abandono nas ruas em qualquer horário – dia ou noite.
Entretanto, para as situações não só de risco real, mas de vulnerabilidade social, diagnósticos devem ser feitos pelos Conselhos Municipais de
Direitos da Criança e do Adolescente, assim como pelas Secretarias de
Assistência Social, devendo os governantes municipais implementar,
posteriormente, políticas sociais básicas, políticas sociais assistenciais
em caráter supletivo e programas de proteção especial, primordialmente nas áreas da saúde, da educação e da cultura, em cumprimento
às disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual prevê
diversas medidas de proteção (a crianças, adolescentes e seus pais ou
responsáveis), não sendo necessários recursos outros, como, por exemplo, o “toque de recolher”.
CONTINUAÇÃO
à época, vigorava no país o primeiro Código de Menores (conhecido como Mello Matos), sendo um outro, em moldes semelhantes,
editado pela ditadura militar em 1979. Nesses tempos, os doutrinadores
do Direito do Menor, segundo Sêda (2009), diziam que estavam abolidos os princípios gerais de Direito para os menores. Com fulcro nesta
argumentação, e no art. 8º da referida legislação, podiam os juízes, “ao
seu prudente arbítrio” determinar medidas que entendessem as mais
adequadas e “se demonstrassem necessárias à assistência, proteção e
vigilância ao menor”.
Contudo, com a evolução do Direito da Criança e do Adolescente
e com o advento da Lei n. 8.069/1990, tida como uma das legislações
mais avançadas nessa área em todo o mundo, há que se fazer uma reavaliação do proceder dos atores do Sistema de Garantia de Direitos que
continuam agindo sob a sombra do menorismo.
E, nesse caso, a referência se aplica a juízes que, em pleno Século
XXI, continuam expedindo portarias para regulamentar, de forma gené-
rica, o direito de ir, vir e permanecer de meninos e meninas brasileiros.
Há que ser salientado, contudo, que não se está defendendo, aqui,
o posicionamento de que a criança e o adolescente poderão permanecer
em situação de abandono nas ruas em qualquer horário – dia ou noite.
Entretanto, para as situações não só de risco real, mas de vulnerabilidade social, diagnósticos devem ser feitos pelos Conselhos Municipais de
Direitos da Criança e do Adolescente, assim como pelas Secretarias de
Assistência Social, devendo os governantes municipais implementar,
posteriormente, políticas sociais básicas, políticas sociais assistenciais
em caráter supletivo e programas de proteção especial, primordialmente nas áreas da saúde, da educação e da cultura, em cumprimento
às disposições do Estatuto da Criança e do Adolescente, o qual prevê
diversas medidas de proteção (a crianças, adolescentes e seus pais ou
responsáveis), não sendo necessários recursos outros, como, por exemplo, o “toque de recolher”.
CONTINUAÇÃO
Faz-se importante, nesse contexto, que se mude a direção do olhar
e que se compreenda, de uma vez por todas, que quem está em situação
irregular é o adulto que se omite na fiscalização, no diagnóstico e na
implementação de políticas públicas em prol do público infantojuvenil,
que, não custa relembrar, é sujeito de direitos, e não meninos e meninas
brasileiros que se encontram nas ruas em horário noturno.
O Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
– CONANDA, em parecer
1
claramente contrário à medida, assim se
posicionou quanto a esse aspecto:
Conforme os motivos acima elencados, o Toque de
Recolher contraria o ECA e a Constituição Federal.
É uma medida paliativa e ilusória, que objetiva
esconder os problemas no lugar de resolvê-los. As
medidas e programas de acolhimento, atendimento
e proteção integral estão previstas no ECA, sendo
necessário que o Poder Executivo implemente os
programas; que o Judiciário obrigue a implantação
e monitores a execução e que o Legislativo garanta
orçamentos e fiscalize a gestão, em inteiro cumprimento às competências e atribuições inerentes aos
citados Poderes.
Nesse sentido, deve ser enfatizado que a proteção da infância e
da adolescência brasileiras passa, necessariamente, pelo fortalecimento
do Sistema de Garantia de Direitos, em especial por meio da atuação
coordenada de todos os atores que compõem a Rede de Proteção, e não
através da coerção e da restrição de direitos, consoante ocorre com a
implementação da medida em questão.
Saliente-se, ainda, que a apreensão da criança e do adolescente com
esteio em medidas como o “toque de recolher” é situação que importa
em constrangimento, vexame e humilhação, contrariando os termos dos
artigos
2
15, 16, 17 e 18 da Lei n. 8.069/1990. Ademais, além de se tratar
1 A nota de posicionamento contra o Toque de Recolher pode ser lida na íntegra no endereço http://www.direitosdacrianca.org.br/midia/posicionamentos/nota-deposicionamento-contra-toque-de-recolher.
2 Art. 15. A criança e o adolescente têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade
como pessoas humanas em processo de desenvolvimento e como sujeitos de direitos
civis, humanos e sociais garantidos na Constituição e nas leis.
Art. 16. O direito à liberdade compreende os seguintes aspectos:
CONTINUAÇÃO
de prática ilegal e inconstitucional, consoante explana Digiácomo (2009):
[...] à luz do ordenamento jurídico vigente, vale dizer que caso os referidos ‘toques de recolher’ sejam
acompanhados da apreensão de adolescentes que
descumpram suas disposições, poderá restar caracterizado, por parte dos responsáveis por sua apreensão
ilegal, o crime tipificado no art. 230, da Lei 8.069/90,
que somente permite a privação de liberdade de
criança ou adolescente que se encontre em flagrante
de ato infracional ou mediante ordem legal, expressa
e fundamentada de autoridade judiciária competente
(o que não é o caso, logicamente, de uma portaria
manifestamente ilegal e inconstitucional, expedida
fora do âmbito da competência normativa da Justiça
da Infância e da Juventude). (p. 199)
E não é só. Em se tratando de co-responsabilidade, estabelecida
constitucionalmente, entre família, sociedade e Estado, não se pode
impor e cobrar somente do Estado as suas obrigações.
Aos pais negligentes e omissos restaram delineados pelo Código
Civil de 2002, nos artigos 1.637 e 1.638, os casos em que terão suspenso
e aqueles em que perderão o seu poder familiar. Na esfera criminal,
da mesma forma, pais e mães poderão ser punidos por crimes estabelecidos no Código Penal, tais como o abandono material (art. 288) e
o abandono intelectual (art. 246). Contudo, muito mais do que punir,
deve-se criar nos Municípios, em cumprimento ao artigo 90, inciso I, do
I - ir, vir e estar nos logradouros públicos e espaços comunitários, ressalvadas as
restrições legais;
II - opinião e expressão;
III - crença e culto religioso;
IV - brincar, praticar esportes e divertir-se;
V - participar da vida familiar e comunitária, sem discriminação;
VI - participar da vida política, na forma da lei;
VII - buscar refúgio, auxílio e orientação.
Art. 17. O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psí-
quica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem,
da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos
pessoais.
Art. 18. É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondoos a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou
constrangedor.16
ECA, programas de orientação e apoio sociofamiliar, nos quais deverão
existir profissionais especializados, entre eles psicólogos, assistentes
sociais, pedagogos e advogados, para encaminhar e proteger aqueles
que necessitem.
CONTINUAÇÃO
E é por todo o caminhar da história referente aos direitos de crian-
ças e adolescentes que se pode afirmar que medidas que se assemelhem
ao “toque de recolher”, sendo denominadas dessa forma ou não, contrariam frontalmente os princípios consagrados pela Declaração Universal
dos Direitos do Homem de 1948, pela Declaração sobre os Direitos da
Criança de 1959 e pela Convenção Internacional dos Direitos da Criança
e do Adolescente de 1989, ratificada pelo Brasil em 1990.
2 . A CONTRARI EDADE DA MEDI DA RESTRI TI VA À
CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 E AO ESTATUTO DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
A CRFB/88, ao quebrar o paradigma estabelecido pela cultura menorista no Brasil – Situação Irregular do Menor, reconheceu a criança e o
adolescente como sujeitos de direitos, garantindo-lhes todos os direitos
fundamentais, entre eles, o direito de ir, vir e permanecer – Proteção
Integral à Criança e ao Adolescente.
Diante de tais disposições constitucionais, seguiu-se a Lei n.
8.069/1990 que, instituindo o Estatuto da Criança e do Adolescente,
materializou, segundo Sotto Maior, proposta de conferir atenção diferenciada à população infantojuvenil, rompendo com o mito de que a
igualdade resta assegurada ao tempo em que todos recebem tratamento
idêntico perante a lei.
Ao estabelecer restrições à liberdade de locomoção, seja por meio
de portaria judicial, seja por lei municipal, nega-se a meninos e meninas
brasileiros a garantia de igualdade entre todos os seres humanos, sejam
eles crianças, jovens, adultos ou idosos, e, ainda mais, a possibilidade
de exercício dos direitos elementares da cidadania.
Flagrante, portanto, o desrespeito à nossa Lei Maior e ao Estatuto
da Criança e do Adolescente.
CONTINUAÇÃO
2.1 PORTARIAS JUDICIAIS
A regulamentação do “toque de recolher” por meio de Portaria
era prerrogativa conferida pelo “Código de Menores” ao “Juízo de
Menores”, institutos esses revogados com a publicação do Estatuto da
Criança e do Adolescente no ano de 1990.
Com o advento da Lei n. 8.069/1990, o caráter patriarcal do Juiz
de Menores deixou de existir e, desde a sua publicação, as competências
do magistrado, longe de imprecisas, foram detalhadas no texto legal.
Originárias do Código de Menores, a competência para a expedi-
ção de Portarias e Alvarás, depois de receber nova roupagem, foi trazida
para o Estatuto da Criança e do Adolescente.
Os novos contornos estabelecidos pela legislação estatutária à
portaria judicial são salutares, consoante se infere da lição de Digiácomo
(2009), para quem:
[...] apesar de a sistemática introduzida pela Lei n.
8.069/90 ser muito mais complexa do que a anterior,
é ela sem dúvida muito mais correta e acima de tudo
democrática, e, uma vez fielmente observada, dará
pouca ou nenhuma margem para os abusos outrora
verificados e que, em última análise, foram justamente a razão dessa nova regulamentação, fazendo com
que a portaria judicial deixe de ser um mecanismos
de opressão de ‘menores’ para se tornar mais um
instrumento de proteção de direitos de crianças e
adolescentes. (p. 203)
A competência da Justiça da Infância e da Juventude é delineada
nos artigos 148 e 149 do Estatuto da Criança e do Adolescente e não prevê a possibilidade de publicação de Portaria com o intuito de proibir a
circulação generalizada de crianças e adolescentes em razão do horário.
Referida afirmação é corroborada por Digiácomo (2009), quando
ensina que:
[...] não há mais lugar para práticas arbitrárias de
outrora, como os famigerados “toque de recolher” que,
embora bastante comuns à época do revogado “Código de Menores”, hoje violam de forma expressa não 18
apenas o âmbito da competência normativa da Justiça
da Infância e Juventude, mas as próprias disposições
contidas nos arts. 3º, 4º, caput, 5º, 15, 16, inciso I e 18,
da Lei nº 8.069/90, bem como o disposto no art. 5º,
inciso XV, da Constituição Federal, que assegura a
todos, independentemente da idade, o direito de ir
e vir dentro do território nacional. (p. 199)
CONTINUAÇÃO
Não se confundem, portanto, com a competência legislativa para
regular situações genéricas, de modo que a faculdade do magistrado
para disciplinar e autorizar as situações previstas nas alíneas dos incisos
I e II, do artigo 149, em verdade se restringe à aplicação das normas
estatutárias à situação em concreto.
Com efeito, ao estabelecer em seu art. 5º, inc. II, que “ninguém
será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”,
a CRFB/88 sepulta a instituição do “toque de recolher” por meio de
portarias judiciais. Se é certo que ao legislador ordinário não é dado
o direito de restringir a liberdade de locomoção das pessoas, exceto
naquelas circunstâncias ditadas pela Constituição, mais certo é que ao
magistrado não é dado o poder de legislar, ainda mais em afronta a
mandamento Constitucional.
O inciso XV do art. 5º da CRFB/88 também não deixa margem
a nenhuma interpretação no que tange à liberdade de locomoção de
adolescentes, exceto se diante da prática de ato infracional.
Ademais, o magistrado, ao instituir o “toque de recolher”, mobiliza e confere nova atribuição às polícias – a de recolher as crianças e os
adolescentes que estejam desacompanhados em locais públicos após o
horário pré-designado, o que se afigura inadmissível. Não pode o Poder
Judiciário regular, por meio de portaria, as atribuições da Polícia Militar,
sob pena de importar em exercício legislativo indevido, haja vista que,
de acordo com o texto constitucional, é competência privativa da União
legislar sobre as normas gerais de organização, convocação e mobilização
das polícias militares (art. 22, inc. XXI, CRFB/88). Igualmente ilegal seria
conferir tal missão à Polícia Judiciária, que, segundo dispõe o art. 144,
§ 4º, CRFB/88, é incumbida da “apuração de infrações penais”.
Contudo, às portarias judiciais expedidas, caso a caso, aos estabelecimentos, assim como aos proprietários e responsáveis, é que devem
ser direcionadas as ações fiscalizatórias e repressoras a fim de se apurar 19
o seu descumprimento.
Às crianças e aos adolescentes, assim como a seus pais, compete a
aplicação, sendo necessária, das medidas protetivas já previstas respectivamente, nos artigos 101 e 129 da Lei n. 8.069/1990 pelas autoridades
competentes.
CONTINUAÇÃO
O “toque de recolher”, ademais, não protege efetivamente a crian-
ça e o adolescente, já que, em inúmeras vezes, os atos de violência são
praticados no âmbito familiar e pelos próprios pais, que negligenciam,
não educam, assediam, exploram ou não impõem limites aos filhos,
ocasionando, inúmeras vezes com este comportamento, o vagar noturno
de meninas e meninos pelas ruas das cidades, acompanhados somente
por sentimentos de medo e abandono.
E é em razão de afirmativas como essas que se entende que a
adoção de medidas restritivas, como forma de assegurar os interesses
de crianças e adolescentes, apenas respalda e incentiva a leniência do
Estado em cumprir tal mister. Importante destacar que a permanência
do público infantoadolescente nas ruas, especialmente em horários inadequados, não é a causa de eventual desestruturação comportamental,
mas, sim, o fruto de uma desestruturação familiar e Estatal que já se
opera, gerando graves e perversos efeitos.
2.2. LEIS MUNICIPAIS
As Leis Municipais que instituem e disciplinam o “toque de
recolher” destinado a crianças e aos adolescentes são materialmente
inconstitucionais, porquanto a restrição imposta pela legislação colide
frontalmente com a liberdade de locomoção do cidadão, prevista no art.
5º, inc. XV, da CRFB/88:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção
de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e
aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à seguran-
ça e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
XV - é livre a locomoção no território nacional em 20
tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos
da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus
bens;
[...].
A liberdade de locomoção, inserida na categoria de direitos e
garantias fundamentais da Magna Carta, é uma das mais importantes
prerrogativas do ser humano, não podendo ser enfraquecida pela legislação infraconstitucional.
Colhe-se da doutrina de Silva (2006) que:
A liberdade de locomoção no território nacional em tempo
de paz contém o direito de ir e vir (viajar e migrar) e de
ficar e de permanecer, sem necessidade de autorização.
Significa que “podem todos locomover-se livremente
nas ruas, nas praças, nos lugares públicos, sem temor
de serem privados de sua liberdade de locomoção”,
dizia Sampaio Dória no regime da Constituição de
1946. Temos aí a noção essencial da liberdade de
locomoção: poder que todos têm de coordenadar e
“dirigir suas atividades e de dispor de seu tempo,
como bem lhes parecer, em princípio, cumprindolhes, entretanto, respeitar as medidas impostas pela
lei, no interesse comum, e abster-se de atos lesivos
dos direitos de outrem. A lei referida no dispositivo
não se aplica à hipótese de locomoção dentro do
território nacional em tempo de paz. Portanto, será
inconstitucional lei que estabeleça restrições nessa
locomoção. Em tempos de guerra, no entanto, isso será
possível, desde que não elimine a liberdade como
instituição. (p. 238.
CONTINUAÇÃO
Não fosse o bastante, ao restringir a locomoção de crianças e adolescentes, ao pretexto de velar por seus direitos, as leis que instituem
o “toque de recolher” ofendem o princípio da proporcionalidade, tido
por muitos autores como um superprincípio, podendo ser tido como
um verdadeiro parâmetro de controle de constitucionalidade, que visa
a coibir justamente os excessos legislativos. Mendes, Coelho e Branco
(2007) discorrem sobre o referido princípio:21
A doutrina identifica como típica manifestação do
excesso de poder legislativo a violação do princípio
da proporcionalidade ou da proibição de excesso
(Verhältnismässigkeitsprinzip; Übermassverbot), que se
revela mediante contraditoriedade, incongruência e
irrazoabilidade ou inadequação entre meios e fins.
No direito constitucional alemão, outorga-se ao princípio da proporcionalidade (Verhältnismässigkeit) ou
ao princípio da proibição de excesso (Übermassberbot)
qualidade de norma constitucional não escrita. (p.
320.)
Ao comentarem algumas decisões do Tribunal Constitucional
alemão, os três juristas explicam:
O Tribunal Constitucional explicitou, posteriormente, que “os meios utilizados pelo legislador devem
ser adequados e necessários à consecução dos fins
visados. O meio é adequado se, com a sua utilização,
o evento pretendido pode ser alcançado; e necessário
se o legislador não dispõe de outro meio eficaz menos
restritivo aos direitos fundamentais. (p. 320.)
Aplicando-se a tese da adequação e necessidade, tem-se, em primeiro
lugar, que o “toque de recolher” é absolutamente inadequado, pois viola
preceito constitucional, e, depois, é absolutamente desnecessário, já que
totalmente inócuo como medida de segurança pública.
No mesmo norte, a medida não encontra amparo na legislação
infraconstitucional, porquanto que, com a implementação da restrição,
fere de morte os artigos 3º, 4º, caput, 5º, 15, 16, inciso I, e 18 da Lei n.
8.069/1990.
CONTINUAÇÃO
CONCLUSÃO
Considerando todo o acima exposto, deve ser registrado que, em
que pese o clamor da sociedade para a adoção de medidas extremas
pelas autoridades competentes contra crianças e adolescentes que se
encontram nas ruas desacompanhadas de seus pais ou responsável em
horário noturno, medidas restritivas de liberdade, nos moldes do “toque
de recolher”, por certo não se afiguram as mais adequadas.22
Consoante o disposto no art. 227, caput, da CRFB/88,
é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta
prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação,
à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura,
à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência
familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de
toda forma de negligência, discriminação, explora-
ção, violência, crueldade e opressão.
É imperativo que os pais ou responsáveis eduquem, orientem e
cobrem de seus filhos as atribuições condizentes com a idade. Devem
assumir, de uma vez por todas, a sua parcela de responsabilidade e
refletir sobre sua conduta como pai/mãe/responsável antes de se dirigir às autoridades competentes solicitando a eles que adotem qualquer
providência possível a fim de retirar o pupilo do seu lar para que possam
ter sossego.
O Poder Público, por sua vez, tem o dever de assegurar às crianças
e aos adolescentes o saudável desenvolvimento físico-mental, conferindo-lhes saúde e educação de qualidade, oportunidades de lazer e
incentivo ao esporte, bem como orientação e apoio familiar necessários,
tal qual preceituado pela Lei n. 8.069/1990. O cumprimento pelo Estado
de tal mister é que viabiliza o afastamento de crianças e adolescentes
de ambientes inadequados às suas formações e não a edição ilegal e
inconveniente de “toques de recolher”.
Deve o Poder Judiciário, então, tal qual o Ministério Público,
fiscalizar e exigir o cumprimento de tais obrigações pelo Estado e não,
respaldando a sua ineficiência, impor ilegais restrições a quem tem, dia
a dia, seus direitos violados.
CONTINUAÇÃO
Nesse sentido, o Ministério Público de Santa Catarina tem posicionamento institucional contrário à expedição de portarias judiciais
genéricas e edição de leis municipais que visem à implementação do
“toque de recolher”.
Faz-se possível, inclusive, quando necessária, a adoção de medidas extrajudiciais (Pedido de Reconsideração) e judiciais (Mandado de
Segurança), visando à revogação dos termos da portaria que importe
em lesão ao direito da criança e do adolescente de ir, vir e permanecer. Da mesma forma, tem o Ministério Público legitimidade para o 23
ajuizamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade contra eventuais
leis municipais que instituam e disciplinem o “toque de recolher” para
crianças e adolescentes.
Verte inconteste, portanto, que a atuação dos atores que compõem
o Sistema de Garantia de Direitos, sejam eles juízes, promotores de justiça, advogados, conselheiros tutelares ou representantes de órgãos ou
entidades não governamentais, assim como de toda a sociedade, longe
da implementação de medidas restritivas de direitos, deve ser focada,
indiscutivelmente, na implementação definitiva do Estatuto da Criança
e do Adolescente, respeitadas todas as suas peculiaridades, assim como
na plena eficácia do princípio da proteção integral.
Assim, conforme exposto acima, demonstra claramente o posicionamento do Ministério Público do Estado de Santa CatArina.
Sendo assim, não resta dúvidas que o MP de Pomerode, deverá entrar com ação de inconstitucionalidade, se ainda porventura os vereadores aprovarem tal lei.
Isso então demonstra também, o intuito somente eleitoreiro dessa lei do Sr. Hamiltom Petito, Sr. Maurício W., bem como a Sra Neusa Stoll.
LEI DESCABIDA E ELEITOREIRA
VÃO DIZER QUE ELES QUERIAM
MAS A JUSTIÇA NÃO QUER
OPORTUNISTAS E APROVEITADORES
queria saber se um dia um cidadão comum, que não bebe, não usa drogas, dorme às 8 da noite e acorda às 4 da manhã, buscar seus direitos, terá tanta gente querendo defendê-los "DE GRAÇA" também
10:22
Parece que o sr. não entende bem as coisas!!!!!!!!
Para 10:22 entender melhor:
PARA OS MUITOS QUE DESCONHECEM TUDO E NÃO SABEM QUE OS DEVERES SÃO IGUAIS QUE QUALQUER CIDADÃO
De acordo com o Estatuto, toda criança e todo adolescente, embora sejam SUJEITOS de direitos fundamentais garantidos pela Constituição e reproduzidos pelo ECA, TAMBÉM têm o DEVER de RESPEITAR os direitos de seu próximo, que são de mesma qualidade, quantidade e intensidade que os seus, sendo esta obrigação natural decorrente não do Estatuto, mas da própria Constituição da República à qual está aquele subordinado.
Caso a criança ou o adolescente violem tais direitos, a exemplo do que ocorre com os adultos estarão sujeitos à intervenção estatal, inclusive com a possibilidade da aplicação de sanções de inegável gravidade, tal qual a INTERNAÇÃO, sinônimo de PRIVAÇÃO DE LIBERDADE, que pode ser aplicada ao adolescente que pratica crime ou contravenção (tecnicamente chamado de "ato infracional"), com duração de até 03 (três) anos em instituição própria. Em momento algum o Estatuto autoriza qualquer criança ou adolescente a descumprir a lei e/ou a Constituição Federal, pelo que se depreende que os DEVERES das crianças e adolescentes são exatamente OS MESMOS dos deveres de todo cidadão.
10:22
Você tem algum problema???????????
por favor senhores, essa lenga lenga de direitos iguais...
onde acontece isso no nosso país?
por favor
concordo com o primeiro comentarista. Até agora os tres vereadores se aproveitaram de uma situação. Não se lembraram de desegavetar oprojeto quando o Petito era presidente da camara porque? é nítido a intenção eleitoreira. Eu também aposto que no dia 25 caso as autoridades que detém o poder estejam presentes e esclarecam d euma vez por todas a situação, os vereadores estarão tranquilos quanto a esta votação absurda. Bom para uma coisa a foto do ladrão d egalinhas estampada na capa jornal de Pomerode foi clara. Este não era de menor. Portanto, parabéns ao Antenor por ter conseguido adiar a votação. Esperamos serenidade.
Mas pedir mais policiamento e estrutura publica para o combate do crime ai sim também estarei na audiencia. Embora sabermos que a não são os comandantes que darão a uçtima palavra. Quero ver o deputado Gilmar, o deputado João. Muito provavelmente nao estarão presentes.
16:42
Eu não irei por causa dessa situação absurda do toque de recolher, sendo que isso existe já atráves do ECA, sendo que o Conselho Tutelar não faz melhor por falta de estrutura. Ademais a PM pode sim pegar menores na rua em ato infracional, como se chama os delitos de menores.
Aqueles que dizem que policial não pode botar a mão em menor esta redondamente enganado.
Sendo que menor em ato infracional, pode ser apreendido pela PM, será conduzido para a delegacia de polícia, será chamado o Conselho Tutelar e será assinado termo de responsabilidade pelo responsável ou pai/mãe, e assim entregue aos mesmos.
Isso os vereadores aproveitadores Hamiltom Petito, Mauricio W. e Neusa Stoll não dizem para os menos
esclarecidos.
16:42
Se o estado não enviar mais policias, que não enviarão, melhor seria dar uns celulares para os menores que ainda não tem, para ligar para o 190 enquanto eles estão nas praças conversando até altas horas,e verem algo estranho, não é boa sugestão?
18:32
Excelente comentário.
Novamente demonstra a lei eleitoreira que os três vereadores quer que seja aprovado.
Então para não esquecer o nome desses três:
HAMILTOM PETITO
MAURÍCIO W.
NEUSA STOLL
Muito se fala em ECA. Pois bem, estas pessoas são escolhidas pelos representantes de entidades.Alguma está levando a sério isso,esses presidentes com direito a voto que diga-se de passagem já tem problemas suficientes em seu trabalho voluntário em suas entidades, ainda tem tempo ou capacidade para conhecer a legislação para assim poder escolhar as pessoas com melhor perfil? Legalmente teriam que ter, mas aí o segundo ponto. Os eleitos ganham um salário digno para se ocuparem em tempo integral mesmo que em sistema de plantão? Em terceiro. quem paga os salários destes~é o Poder Executivo, logo o setor de Controlodaria deve avaliar rotineiramente as ações. Quarto, também cabe aos vereadores acompanharem a funcionalidade destes Grupos. No fundo, vamos ver novamente que todo o sistema ligado ao ECA está falhando. Talvêz em relação aos menores uma avaliação se faça necessária. Eu gostaria me atrever a dar uma sugestão que a câmara de vereadores a exemplo dos outros poderes comecasse a funcionar em meioperiodo, ou seja, que os vereadores estivessem na câmara diariamente das 15:00 às 19:00 horas por exemplo ou até em horário comercial. Assim ser vereador não significaria receber mais uma renda, mas sim seria sua renda o que os obrigaria a estar mais atentos.
com certeza esse nome não esquecerei
Neusa Stoll
conheço seu caráter, e já tem meu voto, assim como de vários amigos
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