20 de fevereiro de 2012

CEZAR ZILLIG



AI, SE EU TE PEGO!

Sempre soube a verdade simples, que os tempos mudam, que os tempos mudaram. Outro dia, assisti de passagem um documentário com um fragmento sobre Orlando Silva, o cantor das multidões; apercebi-me da imensidão que separa o mundo, o Brasil, em que minha mãe se criou e o mundo em que meus filhos se criaram. Um Atlântico todo cabe nesta fenda. “Tu és divina e graciosa, estatua majestosa,” diante do microfone, envergando terno e gravata borboleta, Orlando Silva cantava com recato, um sentimento, impensável nos dias de hoje. “A deusa da minha rua,...”
cantava para uma plateia trajada a rigor, com o melhor que havia em casa, “trajes de domingo”.
Em geral – mas nem sempre - a gente começa a se sentir gente, a ter opiniões mais elaboradas, na adolescência e isto aconteceu comigo na década de sessenta. Portanto, peguei o ocaso daquela época, experimentei um pouco dessa formalidade ubíqua, onipresente.
Desde então mudou tudo. O Conteúdo das canções, o ritmo, a apresentação, a postura do cantor, o gosto da plateia, o relacionamento artista e público, tudo. Se improvisando em sociólogo amador, dá para dizer que houve uma grande aproximação entre cada elo dessa cadeia; se antes havia uma distância respeitosa, extremada, hoje há uma intimidade demasiada, abusada; chega-se às raias da promiscuidade.
Sem se basear em estatística alguma, até porque não as há, pode-se dizer que a mulher é o tema, o mote, de noventa por cento das letras da música popular. Evidentemente, se mudaram os tempos, os costumes, a mulher das canções se transmutou completamente:
“Ai, se eu te pego,” canta animado e animando Michael Teló, expressando com sua coreografia explicitamente o que pretende caso a pegue...
Dá para se concluir que a mulher deixou de ser estátua majestosa, de deusa que era virou uma espécie de caça muito apreciada e perseguida. Ainda sociólogo improvisado, dá para se dizer que o pedestal em que a mulher pairava principiou a ruir tão logo as primeiras pílulas anticoncepcionais foram engolidas.
Após milênios de grande distinção – discriminação? - a mulher hoje está em pé de igualdade com o homem em quase tudo. Ambos os sexos se tratam por “cara”. Melhorou? Piorou? Não há como saber; a mulher de hoje e a mulher de ontem não calçaram o mesmo sapato.


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Um comentário:

Anônimo disse...

algumas calçam um bem maior que o nosso...

lutaram tanto pra conquistarem o respeito, e agora se deixam cair na desvalorização e na banalização do erotismo. Sei lá... devo estar errado e ser careta, mas sinto falta do romantismo.