31 de outubro de 2011

CEZAR ZILLIG



"FINADOS

Entre minhas recordações mais remotas está uma visita (?) ao Cemitério Municipal de Curitiba; eu deveria ter lá uns três ou quatro anos e fui levado por minha avó. (Visitar cemitérios parece ser uma das predileções de avós...). Seria um “dia de finados”? Pode ser; era uma manhã radiante, lembro-me das velas ardendo, derretendo, junto aos pés da “cruz das almas”, na parte alta do cemitério. Deve ter sido aí que vim a conhecer o cheiro da parafina queimada e que para mim ficou definitivamente associado aos mortos. Embora não goste de visitar os “meus mortos”, sepulturas de familiares e pessoas com quem convivi, gosto de visitar cemitérios, perambular entre túmulos contemplando os semblantes das fotografias mortas, estudar suas roupas, ler epitáfios, – quando os há - conferir datas de nascimentos e mortes, calcular o quinhão de vida que coube àqueles que ali jazem e desde quando. Muitas vezes a vida que desfrutaram coincide com os anos que eu mesmo venho vivendo, anos em que foram meus contemporâneos, portanto. Enquanto eles se foram, eu fiquei; algum desígnio inalcançável assim o determinou. Este tipo de constatação deixa uma incômoda sensação de culpa ou dívida, simplesmente por estar ali vivo diante do jazigo de quem não teve a mesma sorte. Os cemitérios são assim, propícios a estes momentos de reflexão existencial.
Vagar por cemitérios enseja meditações sobre a inexorabilidade da morte, induzem cogitações sobre a finitude inexorável da vida, certeza que perturba. Pode-se duvidar e divergir sobre o que venha depois, mas a certeza da morte é uma unanimidade.
Sempre saímos de cemitérios um tantinho mais humildes e cientes de que a vida que nos resta é um grande bem e precisa ser desfrutada com sabedoria. Visitar uma necrópole deveria fazer parte dos currículos escolares; ao menos uma vez no ensino básico e outra, já mais maduros, no secundário. Serviria para tornar a juventude menos inconsequente, menos arrogante.
Existe um dia que é especialmente dedicado às visitas aos cemitérios: Dia 2 de novembro, dia das almas. Ironicamente, é o pior dia para fazê-lo. A multidão que lá se reúne, por mera convenção, impede tais momentos de enternecimento, de enlevo."


ENVIADO POR E-MAIL.
TAMBÉM PUBLICADO EM: WWW.SANTA.COM.BR

Um comentário:

Dr.Smith disse...

Enquanto isso em Pomerland...
Andar no cemitério dos imigrantes, desviando dos galhos caídos,de botas sete léguas para não ser picado pelas cobras, praticamente nadando no matagal e lutando contra os mosquitos!
Realmente dá para refletir,mas sobre o descaso,a falta de interesse,as promessas de campanha,etc...