26 de dezembro de 2011

CEZAR ZILLIG



"Fatalidade
O sol já ia alto, a manhã cedera lugar ao dia pleno. Um dia de semana, de rotina, um dia como outro qualquer. No quarto o pai ressonava, talvez se recuperando de um terceiro turno; na sala os filhinhos, quatro deles, brincavam contidos para fazer o silêncio tão exigido. Bonança. Isto, reinava a bonança naquele lar.

Súbito uma gritaria irrompe e o cheiro de queimado e também fumaça, toma conta da casa. O pai salta assustado e se depara com labaredas na sala enquanto os pequenos se agarram às suas pernas. Instintivamente coloca para fora os filhos assustados e volta para enfrentar a ameaça. Ameaça grave já que seu lar está instalado numa casa de madeira. Rápido, traça uma estratégia: levar para o banheiro, a única peça de alvenaria da casa, o foco de incêndio e assim faz: puxa para o banheiro o sofá em chamas, planejando dominar ali o foco de fogo. Porém, o sofá era feito de material altamente inflamável e o fogo se alastrou de maneira inesperada e fugiu ao controle. A situação se revelou gravíssima: Humberto, este era o nome do protagonista, se viu preso em uma armadilha mortal. E mais, por um azar ainda maior, na pequena peça sua filha Roberta de 15 anos tomava sua ducha matinal e foi subitamente transformada em mais uma refém da tragédia que se sucederia. Para resumir: ambos tiveram seus corpos literalmente torrados e viriam a morrer uma morte crudelíssima dentro de um e dois dias.

O episódio absurdo marcou de forma indelével os outros protagonistas, diversos filhos menores e entre eles o inocente causador do incêndio e da tragédia. Com quatro anos não se tem noção do que uma chaminha de isqueiro é capaz. Uma flama azul bonita, dócil...

Esta história, tão recente, tão próxima, tão pungente, demonstra como o destino, quando quer, pode ser perverso; em geral ignora-se que a tragédia e a própria morte nos espreita a todo momento. São infinitas as possibilidades onde caprichos do destino podem nos fulminar em meio a mais trivial das atividades. Somos sobreviventes de tragédias que simplesmente esqueceram de acontecer.

Uma realidade cruel e gratuita, difícil de se aceitar. Dentre todas as vítimas, Roberta é que suscita a maior compaixão; entrou para um rápido banho sem suspeitar do imediato suplício e da morte em breve."

2 comentários:

Charmaine disse...

Zillig sempre lúcido... e de forma sensível retratando o nosso trôpego caminhar num mundo repleto de armadilhas fatais! Que você nos brinde sempre com seus artigos esclarecedores!

Anônimo disse...

Bem redigido. Mas doloroso demais.
Sempre alerta é o lema em todas as situações da vida.